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No início de agosto, o ministro da Economia, Paulo Guedes, apresentou uma das propostas da reforma tributária do governo que acarretará no encarecimento de livros.
A sugestão é que o produto editorial deixe de ser isento e o setor colabore com a nova Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%, já que foi desonerado da contribuição do PIS e Cofins em 2004.
A isenção de impostos sobre materiais de leitura existe desde a Constituição Federal de 1946 e foi mantida para incentivar a difusão do conhecimento.
Em resposta à proposta de Guedes, associações da indústria formularam um Manifesto em Defesa do Livro, que tem buscado assinaturas nos últimos dias pedindo a reconsideração da medida ao Congresso Nacional.
Na carta, as organizações apontam que a isenção em 2004, inclusive, permitiu uma diminuição do valor médio dos produtos e alavancada na venda de exemplares, e argumentam que o livro é commodity da economia criativa e sua taxação torna o acesso à educação mais elitista.
O documento é assinado pela ABDR (Associação Brasileira de Direitos Reprográficos), ABDL (Associação Brasileira de Difusão do Livro), ABEU (Associação Brasileira das Editoras Universitárias), Abrelivros (Associação Brasileira de Editores e Produtores de Conteúdo e Tecnologia Educacional), ANL (Associação Nacional de Livrarias), CBL (Câmara Brasileira do Livro), Libre (Liga Brasileira de Editoras) e SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros).
A mudança na tributação, adicionada à crise econômica impulsionada pela pandemia, aumenta consideravelmente os desafios das livrarias, distribuidoras e editoras em se manter viáveis.
Um levantamento feito pelo portal G1 com as associações e livrarias em julho aponta que as livrarias estão reabrindo com vendas 70% menores do que o habitual.
Dados do SNEL apontam que o volume de vendas entre 29 de fevereiro e 24 de março deste ano caiu 4% e atribui a queda à pandemia. Ainda em junho, a Saraiva fechou 14 unidades, com prejuízo de R$ 17,3 milhões.
“Se o imposto vier, fica por tempo indeterminado — uma vez valendo, é uma luta constante para rever a medida. A pandemia, nós esperamos que acabe. É uma tragédia para todos e, principalmente para o leitor.
Se a PEC passa, o preço médio dos livros pode aumentar em 20%. Temos que tornar o livro acessível a preço justo para todos. Deveria ser considerado mais um item na cesta básica. Se onerarmos, vai ser uma tragédia sem precedentes para o mercado”, afirma Vitor Tavares, presidente da CBL.
Se, por um lado, o início do período de isolamento social contribuiu para a diminuição das vendas, por outro, mais tempo em casa e a falta de outras atividades sociais pode ter contribuído para uma melhora no hábito de leitura, argumenta o site Submarino.
“As pessoas estão aproveitando este momento de isolamento social para desenvolver o hábito de ler. Essa mudança de comportamento trouxe uma busca por mais opções de títulos e gêneros literários”, pontua a empresa.
A situação ressoou na Saraiva. “Sofremos com uma pequena queda em vendas em março, porém, a partir de abril, já apresentamos crescimento. O mês de junho foi o melhor mês depois que começou a pandemia”, notifica a livraria.
As livrarias físicas foram as mais afetadas pelo novo coronavírus, sobretudo as que não haviam trabalhado anteriormente com canais online. Algumas delas se reinventaram vendendo livros por delivery e WhatsApp.
Nos três primeiros meses da quarentena, o executivo da CBL informa que as lojas estavam faturando de 30% a 40% com uma boa plataforma de e-commerce.
Agora, com a reabertura gradual, funcionando já durante seis horas, as livrarias aumentaram as vendas para 50%. O presidente da CBL projeta que, até o final deste ano, esse número aumentará para 70% e, mais à frente, em 2021, as vendas poderão se estabilizar.
Nos últimos quatro anos, o varejo do livro passou por crises e prejuízo. Grandes livrarias, como a Saraiva e a Cultura, entraram em processos de recuperação judicial. Em 2019, no entanto, o mercado ficou estável e a projeção era de que este ano houvesse crescimento de 2% a 3%.
Para ajudar os livreiros menores, a CBL, a ANL e o SNEL criaram uma campanha para arrecadar dinheiro (até o final de julho) para 50 livrarias com apenas uma unidade e que tenha 50% do negócio dedicados à venda de livros.
Leitura digital
Sem grande representatividade antes do confinamento, as vendas no digital tiveram ganhos. De acordo com o Submarino, a busca por livros no site aumentou conforme os hábitos se intensificaram na pandemia.
Otávio Marques da Costa, publisher da Companhia das Letras, indica que houve um crescimento expressivo do varejo online desde março, quando as medidas de isolamento social começaram a vigorar no Brasil.
Segundo o executivo, as rupturas logísticas que eram esperadas aconteceram de modo menos intenso do que o previsto e as editoras com catálogos mais extensos conseguiram enfrentar de modo razoável a crise.
O momento também foi propício para a divulgação dos catálogos, que estão ganhando interesse do público e são mais difíceis de comunicar.
A procura por e-books aumentou significativamente.
Levantamento da Bookwire, que distribui e-books, mostrou que o número de exemplares distribuídos pela empresa entre março e abril foi 80% maior do que a soma de 2019 inteiro. Foram distribuídos 9,5 milhões de livros digitais.
Na Cia. das Letras, houve aumento também, mas os livros físicos se superaram. Segundo a editora, a venda de audiolivros vem crescendo ao longo dos anos, mas ainda não é tão significativa.
As livrarias, no entanto, não deixaram de estar no radar das editoras. Em junho, a Companhia das Letras criou um fundo de R$ 400 mil para pequenas livrarias independentes para o financiamento da folha de pagamento.
A empresa também ofereceu seu serviço de logística para pequenos livreiros. “Eles são parte fundamental da cadeia de divulgação e da cadeia do livro. Uma vez que as coisas comecem a se normalizar, queremos que o livreiro independente possa retomar sua atividade porque é uma parte importante da cadeia para divulgação de livros que aparecem menos no varejo online. Se, no final disso tudo, o livreiro independente fechar, o mercado todo perde”, argumenta o publisher.
Soluções de comunicação
Otávio, da Companhia das Letras, atribui a melhora nos canais eletrônicos a um investimento maior para divulgação no ambiente digital. A editora, que sediava diversos eventos físicos para lançamentos, passou a realizar lives diárias com a presença de diferentes selos e criou festivais como o Na Janela, série de bate-papos entre autores transmitido no YouTube. Já foram transmitidas edições de não-ficção, literatura brasileira e sobre ditadura militar em parceira com a Folha de S. Paulo.
“O mercado, em grande medida, já estava atento a isso e adaptando sua estratégia de marketing e divulgação para o ambiente online. Isso deveria estar na mesa de todos os editores. Já era algo independentemente da pandemia. A lógica de divulgação já estava alterada em função disso”, defende Costa.
O Submarino implementou melhorias como a oferta de sinopses mais completas das obras, com visualização mais simples e rápida nas páginas dos produtos.
E a marca tem cedido espaço nas suas redes sociais para debates sobre temas literários, “como uma forma de se aproximar ainda mais dos leitores”.
O e-commerce também tem buscado trazer mais livros em pré-venda e lançamentos. Já a Saraiva tem trabalhado com promoções de incentivo, como cupons de desconto, desconto progressivo e ações de saldão com foco em preço.
Para o presidente da CBL, essas inovações propiciadas pela digitalização — como congressos, festivais e maior troca com os autores nas redes sociais — são o legado positivo da pandemia que deve permanecer.
“A rede mundial está de fato criando um elemento de fusão do livro fantástico e as editoras e livrarias estão aprendendo a trabalhar melhor com as redes sociais. Essas são algumas das coisas boas que permanecerão”, diz.
Fonte: Meio e Mensagem