Por Letícia Toledo | Jornalista / Editora no LinkedIn
Equilibrar os custos no varejo é um desafio desde os tempos em que se trocava um camelo por uma ovelha (ou o certo seria por duas?). Mas, após uma pandemia que chacoalhou o setor e em meio a um cenário macroeconômico ainda desfavorável, varejistas têm tido ainda mais dificuldades para fechar as contas.
Como consequência, muitas estão enxugando seus canais de venda para cortar custos. Gigantes como Polishop e Marisa, por exemplo, optaram por fechar dezenas de lojas físicas. No digital, muitas varejistas têm reduzido o investimento em publicidade, enquanto o crescimento do e-commerce desacelera.
Esse cenário tem trazido à tona a discussão sobre diferentes canais de vendas e levantado perguntas como: afinal, uma estratégia omnichannel é para todo mundo? Ter lojas físicas faz sentido? E ter um e-commerce é mesmo obrigatório? O LinkedIn Notícias foi atrás das respostas com empresários e consultores do setor.
As mudanças da pandemia
Para entender o cenário atual e o futuro dos canais de venda, a consultora de varejo Ana Paula Tozzi, CEO da AGR Consultores, defende que é preciso relembrar o passado recente do comércio no Brasil.
Nos primeiros meses da pandemia, quem tinha lojas físicas passou a utilizá-las para estocar produtos e concentrou esforços e investimentos para crescer no digital. Em um segundo momento, com o comércio já reaberto, muitos varejistas continuaram a utilizar os espaços de lojas para estoque e centro de distribuição. Em paralelo, aqueles que tinham desejo de abrir ou ampliar o número de lojas físicas aproveitaram o momento mais favorável para aluguéis e se instalaram em novos locais.
Do ano passado para cá, no entanto, o mercado de crédito e consumo se deteriorou, obrigando varejistas a reverem seus investimentos.
“Muitos fizeram investimentos altíssimos para integrar as lojas e o online. Agora, passada a euforia, se começa a ter uma discussão sobre o que de fato faz sentido”, explica Tozzi. “O que está claro hoje é que não há um modelo que serve para todo mundo”, diz.
Foco no físico
Em uma decisão para lá de rara no varejo, a rede Avenida fechou o seu e-commerce, aberto em 2019, no segundo semestre do ano passado. “Chegamos à conclusão de que não fazia sentido estar no online. Para vender R$ 1 milhão no e-commerce, eu precisava investir R$ 500 mil em marketing. Essa conta não fecha”, conta Rodrigo Caseli, presidente da empresa.
O Grupo Avenida, que reúne as marcas Lojas Avenida e Giovanna Calçados, tem suas lojas concentrada nas regiões Norte e Centro-Oeste do país, onde vende desde roupas até eletrônicos. São produtos focados no público de classe C e D e com preço médio de R$ 33 — um valor baixo demais para justificar as altas tarifas do frete do online para regiões mais afastadas do país.
Para crescer seu e-commerce, o grupo vinha focando na venda de celulares, que chegaram a representar quase 50% de seus pedidos online. “Estávamos vendendo muito bem telefonia porque baixamos os preços, mas isso nos trouxe 20% de Ebitda [geração de caixa] negativo”, afirma o CEO do grupo.
A decisão de fechar o e-commerce aconteceu após a companhia ter sido comprada pela sul-africana Pepkor, que possui mais de 5.800 lojas no continente, e, por lá, foca em sua expansão no mundo offline.
“A Pepkor entende que a venda online não faz sentido para o nosso tipo de negócio. Para tickets mais alto, pode ser uma baita estratégia, mas não é o que o nosso cliente busca”, diz Caseli.
O plano atual da Avenida é chegar a 300 lojas físicas até 2026, ante as 140 atuais. No ano passado, o primeiro da varejista com os novos controladores, a empresa aumentou suas vendas em 24%, alcançando R$ 1,2 bilhão. Caseli afirma que o crescimento da rede nos meses de junho e julho continua acima de 20%, considerando as lojas abertas há mais de 12 meses.
Esse aumento nas vendas apesar do cenário macroeconômico vem de uma série de medidas que a Avenida vem adotando e que inclui uma maior oferta de crédito no cartão do grupo e um trabalho junto a fornecedores para reduzir o preço de produtos.
“É claro que o nosso público compra no online, mas, no momento de compra barata, o cliente vai na loja da rua que ele gosta. Nesse tipo de compra, ele não vai fazer o pedido por um site e esperar uma semana ou dez dias até seu produto chegar, vai ver o que tem disponível a loja”, defende Caseli.
A saída é o digital
No concorrido mercado de moda online, a LV Store, da empreendedora Letícia Vaz, chama atenção por se manter em crescimento ano após ano. No mercado desde 2015, a empresária presenciou toda a grande mudança vivida no e-commerce nos últimos anos.
“No começo, ter uma boa plataforma de e-commerce era algo mais difícil e usar as redes sociais para a venda não era uma estratégia difundida. Hoje a barreira de entrada está baixa e a concorrência é enorme”, afirma vaz.
Sem planos para abrir uma loja física e buscando fugir dos altos custos de aquisição de clientes no online, a estratégia de LV tem se concentrado em engajar e aumentar a recorrência de compras de quem já é cliente.
A estratégia de engajamento inclui iniciativas como: grupos exclusivos no WhatsApp para clientes VIPs com troca de conversas e eventos exclusivos, o lançamento de novas peças e coleções semanal ou quinzenalmente e a oferta de cupons e descontos personalizados. Hoje, cerca de 40% das clientes da LV realizam pelo menos uma compra por mês.
“O físico é uma boa saída para essa questão de experiência, mas eu não enxergo como uma estratégia para a empresa hoje”, afirma Vaz. A companhia deve faturar entre R$ 10 e R$ 12 milhões neste ano.
Do omnichannel ao comércio unificado
Para as grandes varejistas com dinheiro em caixa, o omnichannel, é claro, continua sendo uma estratégia e tanto. “O físico e o digital se complementam e impulssionam um ao outro”, afirmou Fernando Figueiredo, diretor de canais digitais da Lojas Renner S.A., durante o evento Fórum E-commerce 2024.
Em uma apresentação, ele destacou que, para a Renner, a loja física tem diferenciais como a facilidade na experiência de compra, o atendimento humano e a utilização do espaço como hub logístico e de distribuição. Já no aplicativo e site, a possibilidade de construir narrativas ao redor dos produtos, mostrar tendências e trazer conteúdo adicional tornam-se um grande diferencial.
Além do famoso omnichannel, aos poucos um outro termo começa a ganhar força no mercado: o comércio unificado. “O comércio unificado representa a próxima fase na evolução do varejo, indo além da integração de canais para criar uma experiência verdadeiramente coesa e unificada para os clientes”, explica a estrategista de transformação digital Andréa Dietrich em um artigo sobre o tema.
Indo além dos termos, executivos afirmam que o importante mesmo é construir uma estratégia alinhada com os hábitos de seu consumidor.
“O primeiro passo é estudar e entender a jornada do shopper. Conhecer como seu cliente compra e o que ele mais valoriza em cada momento pode ser o que vai definir o sucesso da sua estratégia”, defende Marcelo Cerqueira Ramos, Msc, gerente de vendas na Cargill.
“Talvez a grande discussão para as empresas não seja apenas em como ampliar a capacidade de vendas com o menor investimento, mas sim em como conseguir se diferenciar dos demais e atender as necessidades das pessoas da forma que seja melhor para elas. A venda e até mesmo a melhora na margem será consequência”, escreve o consultor de relacionamento com clientes Márcio Oliveira, a sobre o tema.
Fonte: Linkedin.